terça-feira, 17 de maio de 2011

Cibercultura

Quando comecei ler o livro Cibercultura de Pierre Lévy a primeira coisa em que pensei foi: como?
  • Como uma pessoa pode ter pensado em conceitos, no início dos anos 90, que até hoje são tão atuais.
  • Como uma pessoa pode ser tão benevolente com o desconhecido a ponto de pedir para que os outros estejam abertos às inevitáveis mudanças que as redes de comunicações trariam para as nossas vidas.

  • Como uma pessoa pode definir um termo como Ciberespaço em “o espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial dos computadores e das memórias dos computadores” (LÉVY, 1999, pág. 92), sendo que, o termo Ciberespaço, até então, só havia sido usado pelo seu criador, Willian Gibson, escritor norte americano, em seu livro de ficção científica - Neuromancer.

  • Como esta mesma pessoa pode definir Cibercultura como “conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço”. (LÉVY, 1999, pág. 17).
  • Como uma pessoa pode prever que depois do ano 2000  a  capacidade de memória e de transmissão aumentariam e seriam inventadas novas interfaces com o corpo e o sistema cognitivo humano como, por exemplo, a “realidade virtual”. (p.20)
A cada página do livro Cibercultura a palavra COMO se tornava ainda mais presente em minha mente e nada melhor que a Internet, a rede de comunicação que o próprio Lévy nos pediu benovolência, para buscar algumas respostas.
Antes do início da leitura do livro, já tinha visto o vídeo da entrevista concedida pelo Pierre Lévy no programa Roda Viva em 2001, na qual ele comenta que é possível fazer um resumo do todo e, como Noé, escolher o que é essencial, sem a necessidade de abraçar o todo. Confesso que as palavras do filósofo deram conforto à minha ansiedade de fazer uma busca na Internet ­­sobre ele mesmo, pois me senti mais à vontade para filtrar e descartar várias informações. Por ser uma entrevista “antiga”, quis atualizar a sua imagem na minha memória, saber como é essa pessoa que a mais de uma década já previa o que estamos vivendo hoje.
Imagem da entrevista no Programa Roda Viva, Brasil, 2001
Foto tirada no Web Science 2010, Londres,  por Samuel Huron
Depois, em mais algumas buscas, sabendo que não precisaria “abraçar o todo”, encontrei um vídeo de uma entrevista concedida por Pierre Levy, em fevereiro/2011, para Sala Sociedade de Linguística Aplicada que, finalmente, trazia a resposta que desde o início dos estudos me perseguia: como uma pessoa pode....
A entrevista tem duração de um pouco mais de 8 minutos e, a partir do 5º minuto, Pierre Lévy explica, de uma maneira bem objetiva, quando/como iniciou seus estudos sobre a Cibercultura, Internet, Inteligência Coletiva, etc.

De acordo com Lévy, a primeira coisa foi não acreditar na mídia, que via a Internet como um instrumento de isolamento e hoje, como todos podem acompanhar, existe um contato social maior e mais comunicação.  Para ele é preciso entender a tecnologia na história da humanidade, como as coisas aconteciam antes e depois da tecnologia. O filósofo também se interessa por tradição e como as memórias são transmitidas de uma geração para outra geração.

Resolvida a questão do COMO, que não saía da minha cabeça, resolvi seguir com os estudos e, como o próprio filósofo diz: é nossa responsabilidade saber o que nos interessa. Senti na pele como é difícil escolher o rumo quando depende de nós...
Com o avançar das horas, já não me sobrava muito tempo para uma leitura mais aprofundada do autor e optei em estudar com mais atenção o capítulo VII, O movimento social da Cibercultura (Lévy, 1999, p. 123). A escolha deste capítulo justifica-se por querer entender melhor sobre os princípios básicos da Cibercultura: interconexões, comunidades virtuais e inteligência coletiva.
Então vamos lá...preferi destacar alguns trechos da obra de Lévy antes de fornecer exemplos de cibercultura:
  • Interconexões: “uma das pulsões mais fortes na origem do ciberespaço”; “constitui a humanidade em contínuo sem fronteiras” (Lévy, 1999, p. 127);
  • Comunidades virtuais: “se apoia na interconexão”; “uma comunidade de interesses, de conhecimentos, sobre projetos mútuos, em um processo de cooperação ou de troca, tudo isso independentemente das proximidades geográficas e das filiações institucionais” (Lévy, 1999, p. 127); “para aqueles que não as praticam, esclarecemos que, longe de serem frias, as relações on-line não excluemas emoções fortes” (Lévy, 1999, p. 128); criação de algumas regras de convivência para “fazer com que os outros não percam tempo” (Lévy, 1999, p. 127), também existem regras de boa convivência para garantir o respeito entre os integrantes da comunidade, o que não tem nada a ver com censura, muito pelo contrário, a liberdade de palavra é encorajada sempre; reciprocidade é um sentimento implícito nas relações entre os participantes da comunidade, se recebes algo precisa dar algo, sendo que esta troca não é imposta, mas está subtendida;
  • Inteligência coletiva: “finalidade última” da Cibercultura; “é um campo aberto de problemas e pesquisas práticas” devido a sua ambivalência (Lévy, 1999, p. 132); “modo de realização da humanidade que a rede digital universal felizmente favorece” (Lévy, 1999, p. 132).
Juntando tudo...
“Não há comunidade virtual sem interconexão, não há inteligência coletiva em grande escala sem virtualização ou desterritorialização das comunidades no ciberespaço. A interconexão condiciona a comunidade virtual que é uma inteligência coletiva em potencial” (Lévy, 1999, p.133).
Após um apanhado sobre as ideias de Pierre Lévy sobre a Cibercultura, apresento três exemplos que acredito sejam significativos:
  • Moodle – o Moodle é um sistema de gerenciamento de aprendizagem, ou seja, uma interface desenvolvida pelo australiano Martin Dougiamas cujo objetivo é “disponibilizar aos educadores as melhores ferramentas para gerenciar e promover a aprendizagem”. O Moodle é distribuído sob a licença de software open-source, ou seja, pode ser usado por quem tiver interesse. Qualquer dúvida pode ser postada na comunidade Moodle, seja técnica, pedagógica, de administração do sistema, entre outros. Ao “lançar” o seu questionamento no ciberespaço, a comunidade virtual do  Moodle.org, formada por mais de 1 milhão de usuários de 213 países (fonte: http://moodle.org/community/, acessado em 15/05/2011) , encarrega-se de responder as dúvidas e ainda a mantém em seu banco de dados para posterior consulta. O Moodle é totalmente livre de obrigações financeiras, porém aceita doações para a manutenção do projeto.
  • – o movimento das redes sociais é uma coisa impressionante e o número de usuários do Facebook comprova o sucesso. É algo contrário a todas as previsões da mídia sobre o isolamento que a internet poderia impor à sociedade. Muito pelo contrário, o Facebook passou a ser um ponto de encontro para muitas pessoas, passou a ser um dos sites mais acessados do mundo desde 2010.  São mais de 500 milhões de usuários trocando todo tipo de informação, são mais de 900 milhões de objetos trocados entre páginas, grupos, eventos e páginas da comunidade pelos usuários. Alguns números sobre Facebook;
  • Estudo de caso do Restaurante Fellini – ops! O que é isso? Explico: trabalho em uma faculdade que oferece um curso de Administração via Internet, só este caso já seria um exemplo significativo considerando que a educação a distância online está diretamente ligada à cibercultura, porém faço questão de compartilhar o que aconteceu neste último mês na nossa faculdade. Os alunos do Brasil, Japão e Angola deveriam publicar um comentário sobre o caso do Restaurante Fellini para se prepararem para a discussão no encontro presencial. Em princípio, a atividade de leitura era individual, porém, para a nossa surpresa (sou da gestão pedagógica), observamos um movimento espontâneo dos alunos e tutores em conversar com o dono do restaurante pelo site institucional do restaurante e pelo Facebook, em ambos os canais, a equipe do estabelecimento foi muito receptiva às sugestões e às mensagens dos alunos e tutores. A faculdade também fez questão de publicar em sua página do Facebook um comentário sobre o restaurante e os alunos que fazem parte da lista de contatos da página da faculdade também tiveram acesso a toda esta movimentação.  Fico me perguntando quando, antes da internet, isso seria possível, sem uma interconexão, não teria o movimento dos alunos e nem tão pouco a construção de uma inteligência coletiva - de 40 alunos pode chegar a 500 milhões de pessoas. Exageros à parte, percebe-se que a simples leitura de um artigo pode ficar bem mais interessante com os vários caminhos que as redes de comunicações nos oferece.
Sem Internet

Com Internet





Ao final deste post fico me perguntando...será que escolhi o caminho certo para realizar a atividade da UC Educação e Sociedade em Rede? Será? Acho melhor publicar logo o post antes que a minha ansiedade volte e tenha que me apegar novamente às palavras de Pierre Lévy que, inclusive, está na minha lista de contatos no Facebook ;)

Sabe quando isto aconteceria antes da Cibercultura? Acho que já sabem a resposta....

Referência bibliográfica:
Lévy, P. (1999) Cibercultura. Editora 34, São Paulo,1999.

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